Artigo publicado no jornal Valor Econômico de 22/04/2014
O último livro de Alex Pentland - Social Physics, Editora Penguin – começa com uma observação crítica incontornável em torno daquilo que são as ciências sociais.
Os dados em que se apoiam são marcados por uma dupla deficiência.
Quando tentam acompanhar ao vivo e compreender como se formam e como se
modificam os costumes humanos, os antropólogos e os etnólogos produzem
textos frequentemente notáveis, mas baseados na observação de um número
limitado de casos. Por outro lado, dados de recenseamentos ou pesquisas
de opinião são massivos, mas estáticos: oferecem retratos aos quais os
cientistas procuram dar vida por meio da elaboração de hipóteses
relativas a sua evolução.
A grande novidade da física social é que pela
primeira vez existe a possibilidade de obter, processar, analisar e
discutir observações referentes aos comportamentos das pessoas no
momento mesmo em que agem. As mídias digitais abrem caminho para que sejam formados laboratórios vivos,
nos quais se pode não apenas observar a formação e as mudanças na
cultura humana, mas também interferir sobre sua dinâmica. A
disponibilidade dessas informações traz a chance inédita de que sejam
testadas empiricamente hipóteses referentes ao fluxo de ideias e
informações e sobre a maneira como interferem nos comportamentos dos
indivíduos. Em alusão aos microscópios e aos telescópios, Pentland fala
de socioscópios, para caracterizar a física social.
O livro explora as consequências dessa abordagem para as organizações empresariais e para o planejamento urbano.
No caso das empresas, o grande achado é que a inovação não vem nem de
indivíduos excepcionalmente bem dotados nem de incentivos econômicos
convencionais. Vem de redes. O segredo está em combinar laços fortes de
confiança (característicos de pessoas que se conhecem e se encontram com
frequência) com laços fracos que estimulam indivíduos e grupos a buscar
informações e formas de abordagem diferentes daquelas às quais suas
próprias redes estão habituadas.
Quanto às cidades, o laboratório de Pentland coordena iniciativas de
planejamento baseadas no uso de “big data” em Trento, na Itália, e em
Abidjan, na Costa do Marfim. Em ambos os casos, o trabalho é levado
adiante em aliança com universidades, empresas de telecomunicações,
governos e organizações da sociedade civil, para abordar temas de mobilidade, saúde pública, abastecimento e segurança de forma inovadora.
As tecnologias que permitem acompanhar ao vivo aonde vamos, como nos
deslocamos, com quem falamos e em que tom de voz, o que compramos, o que
baixamos na internet, o que comemos e o que vestimos inspiram o temor
de que o crescimento das mídias digitais seja acompanhado pela perda das
liberdades humanas.
Pentland, que é frequentador assíduo do Fórum Econômico Mundial
e cujas orientações de doutorado resultam com frequência em start-ups
dirigidas por seus alunos, está consciente desse risco. A maneira de
evitá-lo passa pelo que chama de um “New Deal on Data”, ou seja, um
conjunto de garantias protocoladas, pelas quais cada um de nós é dono
das informações que produz (voluntariamente ou não) e sua utilização só
pode ser feita com o objetivo de produzir o bem público e mediante
autorização consciente e bem informada. Um caminho interessante para que
o avanço científico e tecnológico contribua para fortalecer não só o bem-estar material, mas a democracia nas sociedades contemporâneas.
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