A produção e o consumo são grandes impulsionadores da economia e,
quando feitos com foco em responsabilidade socioambiental, têm grande
contribuição para o desenvolvimento sustentável. Produzir de maneira
mais responsável envolve novas formas de pensar produtos e serviços,
inovando em soluções de menor impacto ambiental e maior valor social.
Neste cenário, é crescente o número de consumidores que cobram atitudes
diferenciadas e empresas engajadas nesta nova perspectiva, dando
preferência produtos e serviços sustentáveis.
Em entrevista ao Centro Sebrae de Sustentabilidade, na Semana do Meio
Ambiente, Helio Mattar*, diretor-presidente do Instituto Akatu, fala
sobre exigências de mercado e novas formas de produção e consumo mais
responsáveis.
O mercado nacional tem cobrado posturas mais responsáveis das
empresas. Quais iniciativas são esperadas, especialmente dos pequenos
negócios?
O consumidor brasileiro espera que as empresas façam mais do que está
estabelecido pelas leis. Uma pesquisa realizada pelo Akatu mostra que
53% dos consumidores concordam com esta afirmação. Levando em
consideração esta expectativa, perguntamos quais atitudes ele espera das
empresas, e oferecemos 30 alternativas relativas à sociedade e meio
ambiente. Primeiro, a empresa não deve usar trabalho infantil e forçado.
Isto aparece desde a primeira edição da pesquisa, em 2000. Segundo, é
que as empresas devem ter um programa de contratação de mulheres, negros
e pessoas com deficiências. Terceiro, que ela garanta uma remuneração
justa para seus colaboradores. Quarto, que ela minimize os riscos a
segurança e saúde do consumidor. Todas estas iniciativas indicadas pelo
consumidor se aplicam tanto para grandes, quanto para pequenas empresas,
na indústria, serviço ou comércio.
Continuando a listagem, ele fala sobre a importância da reciclagem,
uso de água e educação. Educar o consumidor sobre os impactos
socioambientais do consumo é um fator que começou a aparecer há dois
anos. Existe, hoje, uma sensibilidade do consumidor nesta direção, e ele
entende que deve ser educado para isto.
Outro dado relevante é que o interesse do consumidor por
responsabilidade socioambiental aumento muito, passando de 16% em 2010,
para 60% em 2012. A quantidade de consumidores que se interessam e
buscam informações sobre o assunto também aumentou, de 44 para 60% neste
mesmo período. Estes números são importantes, pois indicam que o
consumidor está passando a fazer escolhas mais conscientes sobre o que
ele vai comprar. Indica que as empresas precisam comunicar o que estão
fazendo, contar para o consumidor seja em seu site ou relatórios.
Apesar desta maior consciência do consumidor sobre a
importância da responsabilidade socioambiental, ainda existem pequenos
negócios que não adotam formas de produção com menor impacto ambiental.
Quais são as barreiras encontradas?
O primeiro fator é a falta de percepção dos empresários sobre a
importância que o consumidor tem dado a estes fatores. Na medida em que
não há essa percepção, ele não busca se diferenciar nas questões
socioambientais. Segundo, a diferenciação socioambiental reduz muito os
riscos em curto prazo, mas traz resultados em longo prazo. Por exemplo,
se uma empresa é pega por trabalho escravo, sofre sanções imediatas. No
entanto, ao adotar posturas responsáveis, sempre evitará que isto
aconteça. O terceiro fator é de natureza tecnológica. Em muitos casos,
para que o impacto ambiental negativo seja reduzido, seja do produto ou
da produção, há uma exigência de tecnologia e investimento, e muitas
vezes o empresário não tem essa possibilidade, ou não valoriza o
suficiente esta iniciativa.
O quarto fator é a necessidade de haver incentivos ambientais para
que as empresas se direcionem a isso. Vários bancos, por exemplo, vem
exigindo declarações de que as empresas não estão ferindo o meio
ambiente e que elas praticam formas de trabalho totalmente aceitáveis,
caso contrário eles não fornecem financiamentos. Quando isto começou,
oito anos atrás, era destinado apenas a grandes projetos, onde o
montante envolvia cinco milhões de reais. Depois, este valor foi
reduzido para dois milhões, e então para créditos cotidianos. Hoje,
também está disponível para os médios e, futuramente, para pequenos.
Isto é importante na medida em que estimula as empresas a adotarem
práticas diferenciadas.
Também poderíamos ter maior regulação do governo quanto à
concentração dos produtos. Em geral, os produtos são vendidos muito
diluídos. Se há maior concentração, reduz-se a quantidade de água, a
quantidade transportada, emite-se menos carbono, há redução das
embalagens, de resíduos a serem reciclados e até menos transporte para
reciclagem. O impacto acontece em cadeia.
É possível aliar crescimento de participação do mercado com produção e consumo sustentáveis?
Sim, mas sem criar expectativas de que isto aconteça em curto prazo.
Existem diversas empresas que adquiriram posições de liderança por
produção e produtos mais sustentáveis, ou que se caracterizaram no
mercado em função da sustentabilidade. O grande fenômeno que está
ocorrendo no século 21 é que os vários públicos que se relacionam com as
empresas, sejam consumidores, fornecedores, comunidade ou governo,
formam uma percepção sobre quem é a empresa, divulgando esta percepção
em seus diversos contatos. Assim, a sua reputação, especialmente em
termos socioambientais, dá-se muito mais pelo que os públicos falam, do
que pelo que ela própria fala. É importante perceber que este processo
não acontece em curto prazo, mas sim na medida em que as pessoas vão
falando sobre sua postura.
Quando o consumidor passa a ter interesse por aspectos
socioambientais, ele começa a olhar de maneira diferenciada e dar
preferência a empresas que tenham esta postura. É um caminho natural a
ser percorrido. A confiança do consumidor só é conquistada, e ele de
fato vê a empresa como diferenciada, quando percebe a forma como o seu
público fala sobre ela.
Quais iniciativas podem ser tomadas pelos empresários de pequenos negócios neste sentido?
Primeiro, é preciso olhar “dentro de casa”, junto aos funcionários,
ter uma relação respeitosa e digna onde a remuneração é adequada. Isto
independe do tamanho da empresa. Segundo, reduzir o consumo de água e
energia, lembrando que isto também é muito valorizado pelo consumidor.
Terceiro, e fazendo relação aos produtos industriais, é preciso garantir
que eles não sejam prejudiciais à saúde e segurança do consumidor. Isto
é uma grande proteção em médio e longo prazo, pois se a empresa causa
algum tipo de dano, pode literalmente acabar com seu negócio. Outra ação
que o empresário pode fazer, sem ter que fazer grandes mudanças, é
olhar a quantidade de emissões líquidas e gasosas, buscando quanto ele
pode reduzir. O pequeno comércio, por exemplo, na maioria das vezes, faz
compras menores nos atacadistas, deslocando-se diversas vezes, o que
leva a mais emissão de carbono. Aumentar o volume das compras e diminuir
as idas ao atacadista é uma ação simples que não demanda investimento.
As certificações podem auxiliar consumidores e empresas? Como?
Com certeza podem ajudar ambos. As empresas, pois estabelecem regras
claras sobre o que é esperado dela, fornecendo parâmetros de como ela
deve atuar. E os consumidores, pois é uma maneira simples de comunicar
qualidade. Sem o selo, fica mais difícil de tomar conhecimento sobre as
atitudes da empresa. O problema é que está sendo criado um número muito
grande de certificações e o consumidor tem dificuldade em reconhecê-los.
Isso faz com que ele dê mais valor às entidades conhecidas.
Quais são as barreiras para que os consumidores adotem posturas mais responsáveis com o meio ambiente?
O consumidor deseja ter esta postura, o que faltam são informações
simples e, de preferência, no ponto de venda. Hoje, com smartphones, as
empresas podem disponibilizar informações sobre suas atitudes
socioambientais por meio dos códigos de barras. O consumidor visualiza
de forma simples e sintética e isto pode ajudá-lo a decidir. Os próprios
varejistas também podem atuar neste sentido, fornecendo informação nas
lojas, segmentando e informando o consumidor sobre onde encontrar marcas
com posturas socioambientais. A questão central é fornecer informação
com credibilidade. Assim, é possível motivar positivamente o consumidor.
* Helio Mattar é diretor-presidente do Instituto
Akatu pelo Consumo Consciente, ex-secretário de Desenvolvimento da
Produção do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio
Exterior. Ex-diretor-presidente da Fundação Abrinq pelos Direitos da
Criança e do Adolescente, co-fundador e membro do Conselho do Instituto
Ethos de Empresas e Responsabilidade Social. Executivo durante 22 anos
em empresas nacionais e multinacionais, bem como em suas próprias
empresas.
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