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quarta-feira, 4 de junho de 2014

Produção e consumo responsáveis

A produção e o consumo são grandes impulsionadores da economia e, quando feitos com foco em responsabilidade socioambiental, têm grande contribuição para o desenvolvimento sustentável. Produzir de maneira mais responsável envolve novas formas de pensar produtos e serviços, inovando em soluções de menor impacto ambiental e maior valor social. Neste cenário, é crescente o número de consumidores que cobram atitudes diferenciadas e empresas engajadas nesta nova perspectiva, dando preferência produtos e serviços sustentáveis.
Em entrevista ao Centro Sebrae de Sustentabilidade, na Semana do Meio Ambiente, Helio Mattar*, diretor-presidente do Instituto Akatu, fala sobre exigências de mercado e novas formas de produção e consumo mais responsáveis.

O mercado nacional tem cobrado posturas mais responsáveis das empresas. Quais iniciativas são esperadas, especialmente dos pequenos negócios?
O consumidor brasileiro espera que as empresas façam mais do que está estabelecido pelas leis. Uma pesquisa realizada pelo Akatu mostra que 53% dos consumidores concordam com esta afirmação. Levando em consideração esta expectativa, perguntamos quais atitudes ele espera das empresas, e oferecemos 30 alternativas relativas à sociedade e meio ambiente. Primeiro, a empresa não deve usar trabalho infantil e forçado. Isto aparece desde a primeira edição da pesquisa, em 2000. Segundo, é que as empresas devem ter um programa de contratação de mulheres, negros e pessoas com deficiências. Terceiro, que ela garanta uma remuneração justa para seus colaboradores. Quarto, que ela minimize os riscos a segurança e saúde do consumidor. Todas estas iniciativas indicadas pelo consumidor se aplicam tanto para grandes, quanto para pequenas empresas, na indústria, serviço ou comércio.
Continuando a listagem, ele fala sobre a importância da reciclagem, uso de água e educação. Educar o consumidor sobre os impactos socioambientais do consumo é um fator que começou a aparecer há dois anos. Existe, hoje, uma sensibilidade do consumidor nesta direção, e ele entende que deve ser educado para isto.
Outro dado relevante é que o interesse do consumidor por responsabilidade socioambiental aumento muito, passando de 16% em 2010, para 60% em 2012. A quantidade de consumidores que se interessam e buscam informações sobre o assunto também aumentou, de 44 para 60% neste mesmo período. Estes números são importantes, pois indicam que o consumidor está passando a fazer escolhas mais conscientes sobre o que ele vai comprar. Indica que as empresas precisam comunicar o que estão fazendo, contar para o consumidor seja em seu site ou relatórios.

Apesar desta maior consciência do consumidor sobre a importância da responsabilidade socioambiental, ainda existem pequenos negócios que não adotam formas de produção com menor impacto ambiental. Quais são as barreiras encontradas?
O primeiro fator é a falta de percepção dos empresários sobre a importância que o consumidor tem dado a estes fatores. Na medida em que não há essa percepção, ele não busca se diferenciar nas questões socioambientais. Segundo, a diferenciação socioambiental reduz muito os riscos em curto prazo, mas traz resultados em longo prazo. Por exemplo, se uma empresa é pega por trabalho escravo, sofre sanções imediatas. No entanto, ao adotar posturas responsáveis, sempre evitará que isto aconteça. O terceiro fator é de natureza tecnológica. Em muitos casos, para que o impacto ambiental negativo seja reduzido, seja do produto ou da produção, há uma exigência de tecnologia e investimento, e muitas vezes o empresário não tem essa possibilidade, ou não valoriza o suficiente esta iniciativa.
O quarto fator é a necessidade de haver incentivos ambientais para que as empresas se direcionem a isso. Vários bancos, por exemplo, vem exigindo declarações de que as empresas não estão ferindo o meio ambiente e que elas praticam formas de trabalho totalmente aceitáveis, caso contrário eles não fornecem financiamentos. Quando isto começou, oito anos atrás, era destinado apenas a grandes projetos, onde o montante envolvia cinco milhões de reais. Depois, este valor foi reduzido para dois milhões, e então para créditos cotidianos. Hoje, também está disponível para os médios e, futuramente, para pequenos. Isto é importante na medida em que estimula as empresas a adotarem práticas diferenciadas.
Também poderíamos ter maior regulação do governo quanto à concentração dos produtos. Em geral, os produtos são vendidos muito diluídos. Se há maior concentração, reduz-se a quantidade de água, a quantidade transportada, emite-se menos carbono, há redução das embalagens, de resíduos a serem reciclados e até menos transporte para reciclagem. O impacto acontece em cadeia.

É possível aliar crescimento de participação do mercado com produção e consumo sustentáveis?
Sim, mas sem criar expectativas de que isto aconteça em curto prazo. Existem diversas empresas que adquiriram posições de liderança por produção e produtos mais sustentáveis, ou que se caracterizaram no mercado em função da sustentabilidade. O grande fenômeno que está ocorrendo no século 21 é que os vários públicos que se relacionam com as empresas, sejam consumidores, fornecedores, comunidade ou governo, formam uma percepção sobre quem é a empresa, divulgando esta percepção em seus diversos contatos. Assim, a sua reputação, especialmente em termos socioambientais, dá-se muito mais pelo que os públicos falam, do que pelo que ela própria fala. É importante perceber que este processo não acontece em curto prazo, mas sim na medida em que as pessoas vão falando sobre sua postura.
Quando o consumidor passa a ter interesse por aspectos socioambientais, ele começa a olhar de maneira diferenciada e dar preferência a empresas que tenham esta postura. É um caminho natural a ser percorrido. A confiança do consumidor só é conquistada, e ele de fato vê a empresa como diferenciada, quando percebe a forma como o seu público fala sobre ela.

Quais iniciativas podem ser tomadas pelos empresários de pequenos negócios neste sentido?
Primeiro, é preciso olhar “dentro de casa”, junto aos funcionários, ter uma relação respeitosa e digna onde a remuneração é adequada. Isto independe do tamanho da empresa. Segundo, reduzir o consumo de água e energia, lembrando que isto também é muito valorizado pelo consumidor. Terceiro, e fazendo relação aos produtos industriais, é preciso garantir que eles não sejam prejudiciais à saúde e segurança do consumidor. Isto é uma grande proteção em médio e longo prazo, pois se a empresa causa algum tipo de dano, pode literalmente acabar com seu negócio. Outra ação que o empresário pode fazer, sem ter que fazer grandes mudanças, é olhar a quantidade de emissões líquidas e gasosas, buscando quanto ele pode reduzir. O pequeno comércio, por exemplo, na maioria das vezes, faz compras menores nos atacadistas, deslocando-se diversas vezes, o que leva a mais emissão de carbono. Aumentar o volume das compras e diminuir as idas ao atacadista é uma ação simples que não demanda investimento.

As certificações podem auxiliar consumidores e empresas? Como?
Com certeza podem ajudar ambos. As empresas, pois estabelecem regras claras sobre o que é esperado dela, fornecendo parâmetros de como ela deve atuar. E os consumidores, pois é uma maneira simples de comunicar qualidade. Sem o selo, fica mais difícil de tomar conhecimento sobre as atitudes da empresa. O problema é que está sendo criado um número muito grande de certificações e o consumidor tem dificuldade em reconhecê-los. Isso faz com que ele dê mais valor às entidades conhecidas.

Quais são as barreiras para que os consumidores adotem posturas mais responsáveis com o meio ambiente?
O consumidor deseja ter esta postura, o que faltam são informações simples e, de preferência, no ponto de venda. Hoje, com smartphones, as empresas podem disponibilizar informações sobre suas atitudes socioambientais por meio dos códigos de barras. O consumidor visualiza de forma simples e sintética e isto pode ajudá-lo a decidir. Os próprios varejistas também podem atuar neste sentido, fornecendo informação nas lojas, segmentando e informando o consumidor sobre onde encontrar marcas com posturas socioambientais. A questão central é fornecer informação com credibilidade. Assim, é possível motivar positivamente o consumidor.

* Helio Mattar é diretor-presidente do Instituto Akatu pelo Consumo Consciente, ex-secretário de Desenvolvimento da Produção do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. Ex-diretor-presidente da Fundação Abrinq pelos Direitos da Criança e do Adolescente, co-fundador e membro do Conselho do Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social. Executivo durante 22 anos em empresas nacionais e multinacionais, bem como em suas próprias empresas.

Fonte: Site Envolverde www.envolverde.com.br 

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